PERFIL: Quem é o general Mário Fernandes e como ele atuava em plano de matar Lula; militar foi preso na terça
Ele é acusado de ajudar a arquitetar a morte do presidente Lula, do vice, Geraldo Alckmin, e do ministro Alexandre de Moraes. A representação da Polícia Federal e a decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), apontam o ex-ministro interino da Secretaria-Geral da Presidência no governo de Jair Bolsonaro (PL), o general da reserva Mário Fernandes, como peça-chave para articulação de um plano para impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Ele foi preso preventivamente nesta terça-feira (19) no âmbito da operação Contragolpe, deflagrada pela PF, assim como outros três militares do Exército e um policial federal. Além da trama golpista, eles são acusados de arquitetar a morte do presidente Lula, do vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB), e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Até março deste ano, Freire estava lotado como assessor do deputado federal Eduardo Pazuello (PL-RJ).
O general reformado assumiu, entre 2023 e o início de 2024, um cargo na liderança do PL na Câmara dos Deputados, lotado como assessor de Pazuello, com um salário de R$ 15,6 mil. Foi desligado da função em 4 de março deste ano, após o ministro Alexandre de Moraes determinar seu afastamento das funções públicas. Quando foi chamado a depor pela PF em 22 de fevereiro de 2024, optou por ficar em silêncio, alegando não ter tido acesso ao inteiro teor dos conteúdos a investigação.
Os investigadores retratam o general como um dos militares mais radicais envolvidos no plano de golpe de Estado, e era considerado o “elo” de comunicação entre o governo Bolsonaro e os manifestantes que acampavam no quartel-general do Exército após o resultado do segundo turno nas eleições presidenciais de 2022. Ele integrava o núcleo de Oficiais de Alta Patente com Influência e Apoio de Outros Núcleos, grupo chamado de “kids pretos”.
De acordo com a PF, esse grupo, valendo-se de sua posição e influência, incitava e apoiava outros núcleos envolvidos no plano. Nas cerca de 221 páginas, Mário Freire é apontado como um dos responsáveis para que Bolsonaro não desistisse de apoiar o plano. Parte das informações foram recolhidas de dispositivos eletrônicos do militar e da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.
Veja abaixo como a PF descreveu o perfil e a participação de Mário Fernandes:
Antes das eleições
A PF indicou que, antes das eleições de 2022, o general já demonstrava a intenção de promover uma ruptura institucional. Em 5 de julho daquele ano, durante uma reunião com Bolsonaro e outros membros do governo, ele teria defendido a adoção de medidas drásticas antes do primeiro turno. Na ocasião, ele falou sobre a necessidade de agir rapidamente, pois a pressão internacional e a crença da população na estabilidade do governo diminuiria a liberdade de ação após o início do processo eleitoral.
"Então acho que realmente, nós precisamos ter um prazo para que isso aconteça e não, para que eles raciocinem que é importante avaliar essa possibilidade, mas principalmente, para que uma alternativa seja tomada, como o senhor mesmo disse, antes que aconteça. Porque no momento que acontecer, é 64 de novo? É uma junta de governo? É um governo militar? É um atraso de tudo o que se avançou no país? Porque isso vai acontecer. O país vai ser todo desarticulado”, completou.
Na mesma ocasião, ele defendeu a necessidade de cobrar um prazo para que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) autorizasse o acompanhamento das eleições, ressaltando que, caso isso não ocorresse, o governo teria que agir após as eleições, com um risco maior de conturbação e possível uso da força.
“Então, tem que ser antes. Tem que acontecer antes. Como nós queremos. Dentro de um estado de normalidade. Mas é muito melhor assumir um pequeno risco de conturbar o País pensando assim, pra que aconteça antes, do que assumir um risco muito maior da conturbação no ‘the day after’, né? Quando a fotografia lá for de quem a fraude determinar”.
Após as eleições de 2022, general atuou em acampamentos
O relatório da PF detalha que após o resultado do segundo turno, Mário Fernandes intensificou sua participação em ações antidemocráticas. Ele esteve por diversas vezes no acampamento em frente ao QG do Exército em Brasília; e manteve contato direto com manifestantes, buscando auxiliar na resolução de problemas financeiros no acampamento e fornecendo orientações sobre como agir durante as manifestações.
“O contexto das mensagens evidenciam que MÁRIO FERNANDES era o ponto focal do governo de JAIR BOLSONARO com os manifestantes golpistas. Além de receber informações, também servia como provedor material, financeiro e orientador dos manifestantes antidemocráticos instalados nas adjacências do QG-Ex em Brasília/DF, que teve papel fundamental na tentativa de golpe de Estado perpetrada no dia 08/01/2023”, mostra o documento.
Elaboração do plano 'Punhal Verde Amarelo'
Os agentes indicam, por fim, que Mário Fernandes elaborou o plano "Punhal Verde Amarelo", para assassinar Lula, Alckmin e Moraes. O documento chegou a ser impresso por ele no Palácio do Planalto em 9 de novembro de 2022 e posteriormente levado ao Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência da República. No documento, ele cita a criação de um "Gabinete Institucional de Gestão da Crise".
Esse grupo seria composto por militares e aliados do governo Bolsonaro e teria como objetivo gerir a crise política e social que se instalaria após a consumação do plano. “No mais, as apurações apontam indícios de que o referido militar, inclusive, elaborou uma minuta de ‘gabinete de crise’, no qual ele mesmo seria um dos representantes para buscar soluções para a provável crise política, social e institucional que se instalaria na sociedade brasileira”.
A PF encontrou o documento “Punhal Verde Amarelo” em um HD externo de Mário Fernandes. Em um capítulo, o general descreveu os armamentos que seriam necessários para concretizar o plano de assassinato de Moraes: pistolas e fuzis comumente utilizados por policiais e militares, "inclusive pela grande eficácia dos calibres elencados"; além de uma metralhadora, um lança granada e um lança rojão, "armamentos de guerra comumente utilizados por grupos de combate".
Tentativa de influência sobre Bolsonaro
O documento destaca que o general do Exército, como chefe substituto da Secretaria Geral da Presidência, possuía estreita proximidade com pessoas de confiança do grupo do ex-presidente. Ele ainda persuadia Mauro Cid para que reforçasse “conselhos” dados por ele sobre como agir antes e depois do resultado das eleições. Em uma das mensagens, enviada em 7 de dezembro de 2022, ele indica que o plano poderia ser frustrado, caso muito tempo fosse esperado.
Segundo ele, a partir do dia 20 de dezembro, o Comando Militar seria ‘passado’ para militares indicados pelo governo eleito, citado na mensagem como “eventual governo do presidiário”. Ele também contou que estava agindo diretamente junto às Forças Armadas, e orientando tanto o “pessoal do agro quanto os caminhoneiros que estão no QG”. No final da mensagem, ele demonstrou grande preocupação com a possibilidade de ações do Poder Judiciário contra os manifestantes acampados em frente ao QG.
Mário Fernandes solicitou ao então ajudante de ordens que levasse essa questão a Bolsonaro, buscando a proteção dos manifestantes. “No dia 08 de dezembro de 2022, MARIO FERNANDES indica ter conversado pessoalmente com o então Presidente JAIR BOLSONARO. Além disso, mostra grande preocupação com os movimentos antidemocráticos que estavam nas ruas, principalmente com a possibilidade de perder o controle sobre a massa de pessoas envolvidas nas manifestações”.
“No dia 09 de dezembro de 2022, MARIO FERNANDES novamente envia um áudio para MAURO CID, desta vez comemorando que o então Presidente JAIR BOLSONARO aceitou o “nosso assessoramento”. Na mensagem, MARIO FERNANDES pede para que MAURO CID transmita um texto para JAIR BOLSONARO, acerca de como o pronunciamento reverberou entre os manifestantes”, diz outro trecho do relatório.
Insatisfação com Bolsonaro e Forças Armadas
A crescente frustração de Mário Fernandes com Bolsonaro é evidente nos áudios enviados a seus contatos. Ele dizia que o tempo para a consumação do golpe estava se esgotando e que o hoje ex-presidente precisava agir com mais rapidez e decisão. No dia 15 de dezembro de 2022, o militar envia um áudio ao General Ramos, então ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, pedindo que ele "blinde" Bolsonaro contra "qualquer desestímulo" e "qualquer assessoramento diferente".
O general sofria também com a pressão de manifestantes do QG. Nesse sentido, no dia 19 de dezembro de 2022, Fernandes enviou outro áudio, desta vez para o Coronel Reginaldo Vieira de Abreu, no qual critica a postura das Forças Armadas, afirmando que elas estariam aguardando passivamente uma decisão política por parte de Bolsonaro. Fernandes demonstra irritação com essa postura, afirmando: "Cara, porra, o presidente tem que decidir e assinar esta merda, porra".
Assessoria/Caminho Político
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