"Polícia da moralidade" do regime aumentou suas patrulhas de rua para forçar uso do hijab. As mulheres que se recusam a usar o lenço de cabeça estão relatando mais agressões e prisões. As autoridades do regime fundamentalista do Irã intensificaram as patrulhas de rua que reprimem as mulheres que se recusam a seguir os rígidos códigos de vestimenta islâmicos. Sob uma nova campanha chamada nour (luz), endossada pelo líder supremo do país, o aiatolá Ali Khamenei, a "polícia da moralidade" vem assediando e prendendo mulheres que se recusam a usar o hijab, o lenço de cabeça.
Uma mulher de 25 anos, que falou à DW sob anonimato, disse ter sido abordada nas ruas de Teerã quando estava a caminho da universidade em 20 de abril. Ela relatou ter sido cercada por dezenas de policiais que exigiram que ela cobrisse o cabelo. Quando ela resistiu, eles rapidamente recorreram à violência, puxando seu cabelo e assediando-a verbalmente enquanto a arrastavam para uma van.
"Naquele momento, não entendia completamente o que estava acontecendo, só sabia que estavam me batendo. Mais tarde, vi que várias partes do meu corpo estavam machucadas", afirmou.
Enquanto estava sendo espancada e assediada pela polícia, a mulher disse que pensou no movimento Mulheres, Vida, Liberdade, iniciado em setembro de 2022, quando Jina Mahsa Amini, então com 22 anos, morreu após ser levada sob custódia pela "polícia de moralidade" em Teerã por supostamente usar indevidamente um hijab.
A morte de Amini foi seguida pelos maiores protestos que o Irã havia visto em décadas, com milhares de pessoas saindo às ruas em apoio aos direitos das mulheres. As autoridades usaram a força para reprimir os atos, e uma missão de apuração de fatos da ONU estima que 551 manifestantes foram mortos.
"Lembrei-me de Jina Mahsa Amini e de outras mulheres que sacrificaram suas vidas durante o levante das mulheres pela vida e pela liberdade, e disse a mim mesma que tinha de ser forte", disse a mulher.
"Gritei bem alto que meu código de vestimenta é problema meu. Assim que disse isso, começaram os insultos e a violência", disse ela. As policiais a chamaram de prostituta e lhe disseram que, enquanto vivesse no Irã, ela "deveria respeitar as leis do país derivadas dos mandamentos islâmicos".
A mulher disse ter sido levada detida pela polícia, junto com pelo menos outras cinco mulheres que também não usavam lenço de cabeça. Ela foi liberada após várias horas, mas foi forçada a assinar uma carta comprometendo-se a seguir os códigos de vestimenta islâmicos e pode enfrentar um processo judicial.
Repressão renovada
Nas últimas semanas, relatos semelhantes sobre violência excessiva contra mulheres circularam nas redes sociais iranianas. Muitas mulheres compartilharam suas experiências de violência policial, prisão e multas.
Os órgãos legislativos do Irã, a Assembleia Consultiva Islâmica e o Conselho dos Guardiões, que aprovam as leis, estão discutindo projetos de lei que dariam base legal para uma maior repressão às mulheres que se opõem ao uso obrigatório do hijab.
O ressurgimento da violência contra as mulheres começou após o discurso de Khamenei no feriado de Eid al-Fitr, em 10 de abril, que encerra o mês do Ramadã. Ele enfatizou a necessidade do uso obrigatório do hijab e determinou ações contra os "transgressores das normas religiosas".
Após esse discurso, a "polícia da moralidade" aumentou as patrulhas de rua. Os pedidos por maior repressão coincidiram com o ataque em larga escala de mísseis e drones iranianos contra Israel e o aumento da preocupação internacional com a ampliação do conflito no Oriente Médio.Mahtab Mahboub, uma ativista dos direitos das mulheres iranianas que mora na Alemanha, disse à DW que o aumento da repressão aos direitos das mulheres no mesmo momento da escalada das tensões com Israel não é uma coincidência.
"A questão da segurança está no centro das políticas da República Islâmica – segurança externa por meio do ataque ao 'inimigo' e segurança interna por meio do controle dos corpos das mulheres e de todas as minorias sexuais e de gênero", disse.
Ela acrescentou que as mulheres e os manifestantes "são vistos como agentes potenciais de rebelião que podem desafiar o sistema de valores compulsórios" da República Islâmica.
Osman Mozayan, advogado em Teerã, disse à DW que nos últimos dias ocorreram muitas detenções ilegais. "Em alguns casos, as contas bancárias das mulheres foram bloqueadas ou seus carros foram confiscados. Algumas estudantes foram impedidas de entrar nas universidades. Algumas foram inclusive privadas de trabalhar. Suas vidas civis foram interrompidas", disse.
"Essas pessoas são, em sua maioria, encaminhados aos tribunais e, independentemente do veredicto – condenação ou absolvição – essas punições e restrições são irreparáveis", acrescentou.
Iranianas pedem mudanças
Muitos acreditam que os protestos nacionais por direitos das mulheres representam o maior desafio interno ao regime desde que a República Islâmica foi formada em 1979. No entanto, o governo nunca esteve disposto a ceder às exigências de manifestantes, em especial a remoção da obrigatoriedade do hijab.
Ganhadora do Prêmio Nobel da Paz, Narges Mohammadi, atualmente presa em Teerã, descreveu o recente aumento da violência contra mulheres e jovens como um sinal de "desespero" da República Islâmica. Ela disse que a nova política decorre da "dor sem tratamento da ilegitimidade" do regime.
Um grupo de mães que perderam suas filhas e filhos durante os protestos divulgou um comunicado recentemente condenando a "repressão brutal e contínua desse regime misógino". "As mulheres não têm intenção de voltar ao passado, e não aceitam ser consideradas cidadãs de segunda classe nem que o governo patriarcal e a sociedade decidam por elas", diz a declaração.
Rojina, uma jornalista de Teerã que conversou com a DW usando um pseudônimo, disse que, apesar do recente aumento da violência, ela não viu nenhuma mudança nas ruas.
"Todos os dias, muitas mulheres podem ser vistas em público com roupas opcionais. Elas aceitaram que a liberdade tem um custo e estão determinadas a não voltar à vida anterior ao movimento Mulheres, Vida, Liberdade."
A ativista Mahboub está em contato com muitas mulheres no Irã. Ela disse que o movimento "devolveu a autoconfiança perdida às mulheres e lembrou a toda a sociedade que a liberdade das mulheres e dos grupos mais marginalizados é uma medida da liberdade da sociedade".
"Algumas mulheres que ainda saem de casa sem o hijab estão corajosamente recuperando a dignidade perdida. Elas insistem que ninguém tem o direito de decidir por nossos corpos", disse.
Omid Barin/Caminho Político
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