CORONAVÍRUS: No plenário do STF, Gilmar vota contra liberação de cultos na pandemia

Sessão será retomada na quinta. Ministro criticou postura "negacionista" e disse que vetar reuniões religiosas, por período determinado, é compatível com a Constituição. O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, votou nesta quarta-feira (07/04), em julgamento realizado no plenário da Corte, para que governos estaduais e municipais possam proibir, de forma temporária, a realização de cultos religiosos presenciais como medida de contenção da pandemia de covid-19.
Ele já havia antecipado seu posicionamento nesta segunda, de forma liminar, em ação movida pelo PSD contra decreto do governador paulista, João Doria (PSDB), que proibiu reuniões religiosas presenciais, da qual é relator.
No último sábado, véspera do feriado de Páscoa, o ministro Nunes Marques, também de forma liminar, havia determinado que governadores e prefeitos não poderiam proibir a celebração de atos religiosos presenciais, a pedido da da Associação Nacional de Juristas Evangélicos.
As decisões divergentes e a relevância do tema, que motivou o procurador-geral da República, Augusto Aras, e o advogado-geral da União, André Mendonça, a também se manifestarem contra a proibição de cultos, pressionaram o presidente do STF, Luiz Fux, a pautar o julgamento no plenário da Corte. A sessão foi suspensa após o voto de Gilmar e será retomada na quinta.
Proporcionalidade e crise sanitária
Em um voto longo, Gilmar criticou posturas "negacionistas" sobre a pandemia e disse que o livre exercício da fé, garantido pela Constituição, deve ser interpretado em conjunto com outros valores, como o direito à saúde.
O ministro afirmou que a proibição da realização de cultos presenciais, por um período determinado, até que a situação da pandemia melhore, é uma solução proporcional e compatível com a liberdade religiosa.
Para fundamentar sua decisão, Gilmar citou também decisões de tribunais constitucionais de outros países, como uma tomada pela Corte alemã em abril de 2020, que rejeitou o pedido de um cidadão católico que queria derrubar uma portaria do estado alemão de Hesse que proibia, de forma temporária, as reuniões religiosas como forma de combater a pandemia.
O ministro mencionou ainda uma decisão de novembro de 2020 do Conselho de Estado da França, que considerou que a proibição de cultos presenciais, por um período de tempo determinado, estava em conformidade com a Constituição francesa.
Gilmar lembrou que em abril de 2020, no início da pandemia, o Supremo já havia assegurado a estados e municípios o poder de determinar medidas de restrição à circulação de pessoas, contrariando o presidente Jair Bolsonaro, que queria proibir governadores e prefeitos de agirem nesse sentido.
Ele também ressaltou o quadro de "calamidade" enfrentado pelo Brasil no momento, que tem 27% das novas mortes diárias por covid-19 no mundo e 2,7% da população global. Segundo o ministro, o país se tornou um "pária internacional na área da saúde".
PGR e governo defendem cultos
Antes do voto de Gilmar, o procurador-geral da República, Augusto Aras, e o advogado-geral da União, André Mendonça, que é pastor evangélico, defenderam que o Supremo autorize igrejas e templos a realizarem cultos presenciais durante a pandemia.
Ambos são cotados para assumirem a próxima vaga a ser aberta na Corte, com a aposentadoria do ministro Marco Aurélio de Mello, em julho, e se alinharam à posição de Bolsonaro, que é contrário a qualquer medida de restrição à circulação de pessoas, inclusive em cultos religiosos.
Em sua sustentação oral, Aras defendeu que igrejas e templos teriam direito de realizar cultos presenciais durante a pandemia. "O estado é laico, mas as pessoas não são. A ciência salva vidas, a fé também", afirmou.
Mendonça argumentou que a Constituição veda a discriminação de manifestações públicas de fé, e que "não há cristianismo sem vida comunitária". "Por isso, os verdadeiros cristãos não estão dispostos jamais a matar por sua fé, mas estão sempre dispostos a morrer para garantir a liberdade de religião e de culto”, disse.
Em sua decisão liminar de sábado, Nunes Marques, nomeado por Bolsonaro para a Corte, havia defendido a "essencialidade" da atividade religiosa.
Diversos decretos estaduais e municipais proibiram recentemente a realização de cultos e missas com público, visando evitar aglomerações no pior momento da epidemia de coronavírus no Brasil, que já custou mais de 330 mil vidas em pouco mais de um ano.
Conflitos também na Europa
Em países como Alemanha e Coreia do Sul, aglomerações causadas por celebrações religiosas foram apontadas como a origem de diversos surtos de covid-19, levando a uma limitação desse tipo de evento.
Há evidências de que cantar em conjunto em ambientes fechados produz aerossóis com potencial de espalhar a infecção. Diversos eventos promovidos por corais na Europa se tornaram eventos de superdisseminação da covid-19.
Isso não impediu a ocorrência de diversos conflitos. No final de março, policiais holandeses prenderam um homem que golpeou e chutou um jornalista em frente a uma igreja protestante na cidade de Krimpen aan den Ijssel, perto de Roterdã, que estava aberta para uma missa normal, desobedecendo as normas do confinamento em vigor no país.
Frequentadores da igreja Sion, na cidade de Urk, a nordeste de Amsterdam, também atacaram no final de março jornalistas durante uma missa realizada fora de todas as medidas de restrição em vigor. Um fiel deliberadamente usou seu carro para atingir um cinegrafista do lado de fora da igreja, e um suspeito de 35 anos foi detido após o incidente.
Em janeiro, policiais da Alemanha foram acionados para interromper uma missa com cerca de 150 fiéis na cidade de Herford, no estado da Renânia do Norte-Vestfália, que violava as normas antipandemia. Um caso similar ocorreu pouco antes do Natal numa igreja pentecostal da cidade alemã de Essen, onde a polícia interrompeu um culto e aplicou quase 60 advertências por violações ao confinamento.
bl (ots)cp
@CaminhoPolitico @CPWeb

Comentários