Polícia e Ministério Público apoiam proposta da CPI da Pedofilia do Senado; mas ONG Safernet e empresas de telecomunicações dizem que proposta já foi superada pelo Marco Civil da Internet.A proposta que cria novas regras para a guarda e transferência de dados de usuários pelos provedores de internet no caso de investigação de crimes contra crianças e adolescentes (PL 2514/15) dividiu opiniões, em audiência pública realizada na Câmara dos Deputados nesta terça-feira (1).
O debate foi promovido pela Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática, a pedido do relator da proposta, deputado Roberto Alves (Republicanos-SP), com o objetivo de ouvir diferentes partes afetadas pela proposta antes da apresentação do parecer.
Formulado pela CPI da Pedofilia, que funcionou no Senado entre 2008 e 2010, o projeto fixa que provedores de conexão a internet deverão manter dados cadastrais e de conexão de seus usuários por pelo menos três anos. Hoje o prazo previsto pelo Marco Civil da Internet para a guarda dos registros de conexão é de um ano. Além disso, o PL 2514/15 prevê que os provedores forneçam à autoridade policial e ao Ministério Público, sem necessidade de autorização judicial, os dados de conexão e cadastrais do usuário no caso de investigação de delito contra criança e adolescente. O Marco Civil da Internet hoje prevê a necessidade de autorização de juiz para acesso aos dados de conexão.
Crítica à legislação
Para a chefe do Serviço de Repressão a Crimes Cibernéticos da Polícia Federal, Cassiana Saad, as mudanças previstas no projeto de lei representam avanços. Ela considera a legislação atual equivocada ao não permitir a obtenção dos dados de conexão por requisição policial e do Ministério Público. Ela também considera o prazo de um ano previsto para a guarda de dados pelos provedores muito curto.
Essa também é a visão de Leonardo Otreira, coordenador do Núcleo Especial de Combate aos Crimes Cibernéticos do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. Entre os pontos que considera positivos na proposta, ele citou deixar claro que empresas de internet que prestam serviço no Brasil deverão respeitar a legislação brasileira. "Não raras vezes algumas empresas não enviam os dados requisitados alegando que as informações não constam em servidores hospedados no País", disse.
Texto superado
Já o presidente da ONG SaferNet Brasil, Thiago Tavares, defendeu a rejeição do PL 2514/15 pelos deputados. Segundo ele, a maior parte do projeto já foi abordada por outros diplomas legais, como o Marco Civil da Internet; a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, aprovada no ano passado; e o regulamento do Serviço de Comunicação Multimídia elaborado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). "O projeto não vai inovar e vai conflitar com a legislação já existente", opinou.
Ele citou, por exemplo, que os provedores de aplicações estrangeiros já são obrigadas a cumprir a legislação brasileira pelo Marco Civil da Internet. Para ele, é preciso que a Anatel fiscalize o cumprimento das regras já existentes, destacando que 1/3 das conexões no País é provida por pequenas e médios provedores de conexão, que são cerca de 10 mil no País.
Diretor regulatório do Sindicato Nacional das Empresas de Telefonia (SindiTelebrasil), Alexander Castro ponderou que também há previsão legal de que as empresas garantam a privacidade dos usuários, portanto é necessária uma regulamentação clara para o fornecimento de dados deles à autoridade policial. Ele acrescentou que as definições e obrigações de provedores de conexão e de aplicações estão confusas no projeto de lei e defendeu que sejam mantidas as fixadas no Marco Civil da Internet.
Denúncias anônimas
Em 13 anos, a central de denúncias da Safernet recebeu 1,6 milhão de denúncias anônimas de pornografia infantil. Segundo Thiago Tavares, 98% das denúncias recebidas pela organização referem-se a conteúdos hospedados fora do Brasil.
A representante da Polícia Federal, Cassiana Saad, informou que o número de inquéritos em andamento sobre pornografia infantil na internet chega a quase 1.700. Conforme ela, são crimes transnacionais e muitas vezes superam as fronteiras da internet, chegando a abuso sexual real contra crianças e adolescentes. Ela considera essencial reprimir o mercado consumidor. "Não há uma separação, na essência, entre o consumidor desses produtos e o produtor de conteúdo, é uma escalada de comportamento", alertou.
Reportagem – Lara Haje
Edição – Roberto Seabra
Caminho Político
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