Manifestantes da região semiautônoma dobram a aposta e pedem a renúncia da governante local, que é apoiada por Pequim. Eles temem que a lei de extradição seja só o início de ofensiva chinesa contra seus direitos civis.Dezenas de milhares de pessoas foram às ruas de Hong Kong neste domingo (16/06), no que esperam ser o ápice de uma série de protestos que desafiam o governo semiautônomo e as lideranças em Pequim. Inicialmente contra uma legislação de extradição pró-China, as marchas evoluíram para pedir a renúncia incondicional da governante Carrie Lam. A marcha acontece apesar de, um dia antes, a governante da cidade ter suspendido a aplicação de uma lei que permitiria a Hong Kong extraditar potenciais criminosos para a China. Os manifestantes veem no anúncio apenas uma manobra política e dizem que só deixarão as ruas se Carrie Lam renunciar.
A decisão de Carrie Lam, que é apoiada por Pequim, foi considerada o primeiro momento em que a China retrocedeu num tema político importante desde o início da era Xi Jinping, que está no poder desde 2012.
A atual queda de braço, segundo analistas, mostra o dilema central de Pequim em Hong Kong: os chineses querem manter completo controle sobre a região semiautônoma, restringindo a democracia local; mas, ao mesmo tempo, sem plena democracia, os líderes de Hong Kong vem enfrentando sucessivas crises políticas por subestimarem ou ignorarem por completo demandas populares. Todas as vezes, Pequim leva parte da culpa.
Amplos setores da população viram na lei proposta por Carrie Lam uma tentativa de diluir a separação entre a China continental e Hong Kong, o que poria em perigo liberdades como de imprensa e expressão, que estão em vigor na antiga colônia britânica, mas são inexistentes do outro lado da fronteira.
"Estamos lutando por nossa liberdade", disse Betty, de 18 anos, ao jornal britânico The Guardian, durante a marcha deste domingo.
"As nossas exigências são simples. Carrie Lam deve deixar o cargo, a lei de extradição deve ser derrubada e a polícia deve pedir desculpas por ter usado violência extrema contra o seu próprio povo", disse o bancário John Chow enquanto marchava com um grupo de amigos neste domingo. "E vamos continuar", disse.A marcha de domingo pode igualar em escala o protesto de uma semana antes, que levou cerca de 1 milhão de pessoas às ruas para expressar a sua preocupação com as relações atuais da antiga colônia britânica com a China continental. Na quarta-feira, a marcha que cercou a sede do governo terminou com mais de cem feridos e a detenção de 11 pessoas.
O protesto deste domingo atraiu manifestantes jovens e mais velhos. Poucos usavam máscaras ou pareciam preocupados em esconder as suas identidades, em contraste com manifestações de alguns dias antes, quando os participantes expressaram preocupações com a resposta das autoridades.
Ativistas pró-democracia pedem uma greve-geral para segunda-feira apesar da decisão de Lam de suspender os trabalhos sobre a legislação. Alguns sindicatos, associações de professores e outros grupos já anunciaram que vão boicotar trabalho e aulas.
Proposto em fevereiro e com uma votação final prevista para antes do final de julho, a lei que virou alvo dos manifestantes permitiria que a chefe de governo e os tribunais de Hong Kong processassem pedidos de extradição de suspeitos de crimes para jurisdições sem acordos prévios, como para a China continental.
Os defensores da lei argumentam que, caso se mantenha a impossibilidade de extraditar suspeitos de crimes para países como a China, Hong Kong poderia se transformar num "refúgio para criminosos internacionais".
Os manifestantes dizem temer que Hong Kong fique à mercê do sistema judicial chinês como qualquer outra cidade da China continental e de uma Justiça politizada que não garante a salvaguarda dos direitos humanos.
A transferência de Hong Kong e Macau para a República Popular da China, em 1997 e 1999, respetivamente, decorreu sob o princípio "um país, dois sistemas". É exatamente isso que os opositores à nova lei garantem estar agora em xeque.
Para as duas regiões administrativas especiais da China foi acordado um período de 50 anos com elevado grau de autonomia, a nível executivo, legislativo e judiciário, sendo o governo central chinês responsável apenas pelas relações externas e defesa.
RPR/ap/rtr/ots/cp
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