"Relator de privatização da Eletrobras quer fonte permanente de recursos para manter pesquisas do Cepel"
Projeto do governo prevê a manutenção do Centro de Pesquisas de Energia Elétrica por apenas 4 anos, após a desestatização. Depois desse prazo, a associação sem fins lucrativos teria de buscar suas próprias fontes de financiamento. José Carlos Aleluia defende mudança no texto.
O relator do projeto que autoriza a privatização da Eletrobras (PL 9463/18), deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA), sinalizou nesta quarta-feira (25) que vai alterar o texto do governo para garantir uma fonte de recursos permanentes para o Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel), associação civil sem fins lucrativos que atualmente recebe verbas do sistema Eletrobras para investir em pesquisa e desenvolvimento (P&D) do setor.
Will Shutter/Câmara dos Deputados
José Carlos Aleluia defende a criação de uma rede nacional dos centros de pesquisas em energia elétrica
Aleluia considerou inaceitável a proposta governista. O projeto que autoriza a privatização da Eletrobras determina a manutenção do Cepel por 4 anos, contados a partir da desestatização. A partir daí, o centro terá de buscar suas próprias fontes de financiamento. Hoje, 85% do que ele recebe para P&D vêm do sistema Eletrobras.
“Estamos construindo uma forma que não onere o consumidor, que use recursos existentes na pesquisa do setor elétrico, que transforme o Cepel em uma instituição com vários mantenedores, e com uma governança mais eficiente que a atual”, disse Aleluia.
O relator defende ainda a criação de uma rede nacional reunindo centros de pesquisas em energia elétrica.
Aleluia não chegou a delinear a sua proposta, mas ela deve tomar como base uma emenda apresentada pelo deputado Rômulo Gouveia (PSD-PB) ao projeto de desestatização. Pela emenda, o Cepel teria uma parcela dos recursos que os geradores, transmissores e distribuidores de energia elétrica são obrigados a aplicar em P&D, por exigência da Lei 9.991/00. Além disso, caberia à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) definir e aprovar as pesquisas.
"Segurança atemporal"
A emenda foi defendida hoje pelo diretor-geral do Cepel, Marcio Szechtman, que participou de audiência pública promovida pela comissão especial que discute o PL 9463/18. O debate discutiu o papel do centro de pesquisas.
Segundo Szechtman, a emenda garante uma “segurança atemporal” ao centro. “O Cepel exerce um papel de interesse do Estado e da sociedade. Faz sentido abandonar essas conquistas?”, questionou ele.
O centro surgiu na década de 1970 com o objetivo de diminuir a dependência do Brasil de tecnologias estrangeiras – pelo qual o País pagava royalties – em um momento de forte investimento em geração de energia elétrica. Os fundadores foram a Eletrobras e quatro subsidiárias (Chesf, Furnas, Eletronorte e Eletrosul). Atualmente, o centro possui 214 pesquisadores, que atuam em duas unidades no estado do Rio de Janeiro.
Convidado à audiência pública, Agamenon Rodrigues Oliveira, professor da Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), afirmou que o País poderá voltar a ser importador de tecnologia para o setor elétrico com a privatização da Eletrobras e o fim do Cepel. Ele argumenta que os investidores que deverão entrar na privatização da estatal têm seus próprios centros de pesquisa no exterior e deverão trazer de lá os pacotes tecnológicos. “Nós voltamos para a situação da década de 1970”, alertou.
O deputado Leônidas Cristino (PDT-CE) manifestou opinião semelhante. “Os compradores [da Eletrobras] vão trazer para o País os seus institutos de pesquisa”, comentou. “Eles querem comandar o sistema.” Glauber Braga (Psol-RJ) questionou a intenção do governo de dar um prazo para encerrar o financiamento da Eletrobras ao Cepel. “Só tem uma resposta possível para isso: é fazer com que o Brasil fique completamente dependente de interesses que não são nacionais”, sustentou. Por sua vez, a deputada Luciana Santos (PCdoB-PE) disse que o modelo proposto pelo governo para o Cepel significa um retrocesso.
Reunião
Na próxima semana, a comissão especial fará audiências públicas para debater o futuro das tarifas de energia elétrica com a privatização da Eletrobras. Hoje os integrantes do colegiado se reuniram para tentar definir um prazo para o término das discussões e o início da votação do parecer do relator – ainda em elaboração –, mas não houve acordo.
Conforme o deputado Patrus Ananias (PT-MG), 2º vice-presidente da comissão, e que presidiu audiência pública desta quarta, as conversas têm sido positivas e rumam para um “consenso progressivo”. “Nós, da oposição, queremos ampliar o tempo do debate, para que essa discussão chegue à sociedade”, declarou. “Por outro lado, os que apoiam o governo querem agilizar. E nós estamos buscando um ponto de equilíbrio, um ponto de encontro.”
A comissão especial fará uma nova tentativa, no próximo dia 2 de maio, de chegar a um consenso sobre o prazo de funcionamento do colegiado.
Hoje, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, defendeu a privatização da Eletrobras e disse que o setor elétrico gera prejuízos aos cofres públicos. Nos últimos seis anos, segundo ele, o sistema Eletrobras tirou do cidadão R$ 90 bilhões, e o governo só teve capacidade de investir R$ 25 milhões no segmento. “Se tivéssemos economizado esse dinheiro, teríamos mais investimento em infraestrutura e na área de educação, saúde e segurança”, afirmou o presidente.
Também tramita no Congresso Nacional uma medida provisória (MP 814/17) que abre caminho para a privatização da Eletrobras e de subsidiárias. O texto está em análise em comissão mista.
Reportagem – Janary Júnior
Edição – Marcelo Oliveira
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