O líder da oposição no Zimbabué, Morgan Tsvangirai, morreu aos 65 anos de idade. O ex-sindicalista foi um dos maiores críticos de Robert Mugabe. O chefe do principal partido da oposição no Zimbabué, Morgan Tsvangirai, adversário histórico do regime do ex-Presidente Robert Mugabe, morreu na sequência de um cancro, anunciou esta quarta-feira (14.02) Elias Mudzuri, um dos vice-presidentes daquela formação partidária. "Como sabem, o presidente do nosso MDC [Movimento para a Mudança Democrática] Morgan Tsvangirai não estava bem desde há um certo tempo. É com tristeza que anuncio que perdemos o nosso ícone e o nosso combatente pela democracia", anunciou Elias Mudzuri na sua conta na rede social Twitter.
Tsvangirai foi um grande desafio para Mugabe
Não é fácil vencer alguém como Robert Mugabe no seu próprio jogo e conquistar os corações e as mentes dos zimbabueanos. Definitivamente foi um jogo que Mugabe liderou durante muitos anos. Mas Morgan Tsvangirai conseguiu vencê-lo várias vezes. Nas eleições de 2008 Morgan Tsvangirai venceu, embora com uma margem demasiado pequena para obter a maioria. Seguiram-se várias reformas que poderiam ter dado mais poderes a Mugabe, mas que Tsvangirai e outros opositores impediram.
Morgan Tsvangirai não participou no processo de libertação do país e era trinta anos mais novo que Mugabe, mas conseguiu ser líder da oposição e representar o maior desafio para Mugabe.
"Sem Morgan Tsvangirai não poderíamos estar a falar sobre democracia", diz Ostalos Gift Siziba, líder do Núcleo dos Estudantes do Zimbabué. "Ele lutou contra o regime autoritário da década de 1990 quando Robert Mugabe organizava uma máquina violenta e implacável."
Um sindicalista convicto
Nasceu em 1952, filho de uma camponesa e de um mineiro, Tsvangirai abandonou a escola cedo e trabalhou por mais de dez anos numa mina de níquel, onde começou a sua ligação com os sindicalistas da mina. Como sindicalista, juntou-se ao partido no poder ZANU-PF em 1980, logo depois da independência. Como muitos na época, ele admirava Mugabe e depois foi criticado por não ter condenado a repressão contra a oposição em Matabeleland nos finais da década de oitenta. Só em meados da década de 1990 é que Tsvangirai tornou-se abertamente crítico ao regime de Mugabe. "A primeira coisa que soube sobre Tsvangirai foi a campanha que fez a partir do Congresso dos Sindicalistas do Zimbabue. Vi papeis voarem com alertas sobre aumento do preço do pão para 50 dólares zimbabueanos. Na altura o pão custava cinco dólares", recorda Farai Gwenhure da campanha Tajamuka/Sesjikile, um movimento jovem que lida com problemas que afetam os jovens do país. Pouco tempo depois, os preços aumentaram ainda mais. As filas para comprar comida eram uma realidade diária e os dólares zimbabueanos sofreram uma forte desvalorização. Nos anos 2000, o dólar norte-americano e o rand sul-africano subestituiram a moeda local.
A voz da oposição
"Tsvangirai liderou manifestações em massa e boicotes de trabalhadores. Ele negociou os direitos trabalhistas no Zimbabué", lembra Morgan Komichi, vice-presidente do partido de Tsvangirai, o MDC-T. Na altura, Tsvangirai, que continuava a ser membro da ZANU-PF, era o secretário-geral do Congresso dos Sindicatos do Zimbabué. Juntamente com atores da sociedade civil, sindicatos de estudantes e grupos religiosos, tornou-se o líder da Assembleia Constitucional Nacional, uma ONG que organizou protestos, e tornou-se muito crítico do Governo da ZANU-PF. Em 1999, Tsvangirai formou o Movimento para a Mudança Democrática, que se tornou o maior partido da oposição do Zimbabué."
O Governo de unidade nacional
O Governo de unidade nacional durou apenas um mandato, mas Tsvangirai sentiu que Mugabe e a ZANU-PF ainda queriam um ambiente de conflito. Ele passou algum tempo a viajar pelo mundo numa tentativa de restaurar as relações com os governos e instituições internacionais, mas muitos zimbabueanos sentiram poucas mudanças nas suas vidas. Numa entrevista à DW, Tsvangirai admtiu que os apoiantes da oposição sofreram como resultado. "Não foi um acordo perfeito, mas penso que conseguimos salvar o país. Pode ter havido algum dano por causa da desmobilização que teria acontecido nas forças da oposição."Apesar das tragédias pessoais, tais como a morte da sua esposa num acidente de carro onde ele sobreviveu, e a morte do seu neto numa piscina um pouco depois, Tsvangirai continuou a ser um político até ao fim. Viveu para ver o fim do seu rival Robert Mugabe, embora não através da vitória da oposição, mas através de um golpe de Estado feito dentro das própria fileiras da ZANU-PF. Para o Movimento da oposição, bem como o seu próprio partido - que viveu várias divisões ao longo dos anos - ele continua a ser um símbolo. "Aconteceram problemas no partido, mas ele conseguiu manter o movimento", diz Komichi. "Sempre que houve desafios ou divisões, as pessoas continuavam a apoiá-lo e até agora o movimento continua. Ele é o portador da tocha, ele é o visionário".
Nos finais de 2017, falou de uma nova geração que assumiu os comandos do país. "Vejo uma perspetiva iminente de nós, como velha geração, deixarmos a liderança para que os mais novos novos continuem com o que começámos juntos", disse ele. Tanto a geração de Mugabe, que tinha 93 anos quando foi forçado a abandonar o poder, como a dele próprio, com 65 anos, já são a velha guarda. A questão agora é como a nova geração irá prosseguir.
Sella Oneko/cp
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