Carlos Rosado de Carvalho afirma que números apresentados não passam de uma “engenharia financeira”. Especialista do Economist Intelligence Unit (EIU) mostra-se confiante no novo Governo. O Fundo Soberano de Angola (FSDEA), liderado por José Filomeno dos Santos, filho do ex-Presidente angolano José Eduardo dos Santos, registou, pela primeira vez, desde a sua criação, lucros de 44 milhões de dólares. Vários têm sido os analistas e até auditores que têm posto em causa a veracidade destes números. Em entrevista à DW África, Carlos Rosado de Carvalho, analista econômico e diretor do jornal Expansão, afirma que os lucros apresentados pelo Fundo Soberano de Angola são uma "falácia" e não passam de uma "engenharia financeira”. "Estes lucros têm uma carga subjetiva enorme porque resultam de avaliações que foram feitas aos ativos da empresa e que constituem, segundo dizem os auditores, mais valias potenciais que estão envoltas de um certo subjetivismo”, afirma.O que acontece, explica o analista, é que estamos perante ativos que não são cotados em bolsa, o que permite este "subjetivismo”. "O Fundo Soberano passou a adotar as chamadas IFRS, que são, no fundo, normas internacionais de contabilidade, e de acordo com essas normas, os ativos devem ser valorizados ao valor do mercado. O que acontece quando esses ativos são cotados em bolsa é que não existe problema nenhum porque o valor de mercado é o valor da bolsa. O problema é quando esses ativos não são cotados em bolsa, como é o caso da maior parte dos ativos do Fundo Soberano e aí entra uma dose de subjetivismo”. Para Carlos Rosado, que lembra também que "o Fundo Soberano não apresentou as datas às contas”, basta olhar para o caso do Porto de Cabinda para se perceber do que falamos. Uma participação que foi comprada pelo Fundo Soberano de Angola por 185 milhões de dólares, está agora avaliada em quase 400 milhões. "É como se eu comprasse um apartamento no valor de 100 mil euros e de hoje para amanhã digo que ele vale 200 mil e escrevo no meu patrimônio que ele vale 200 mil, portanto são lucros potenciais”, acrescenta.
Para este analista, a razão pela qual os resultados positivos surgem agora, três anos após a criação do Fundo, pode estar relacionada com as pressões a que este Fundo tem estado sujeito. Uma das pressões, avança, prende-se com o facto dos estatutos do Fundo Soberano preverem que "nenhum dos gestores de ativos pode gerir mais de 30% dos ativos”. Mas, acrescenta, há uma entidade, que é a Quantum Global, que possui 85% dos ativos do Fundo Soberano, o que não é possível. Há aqui, do meu ponto de vista, uma tentativa de dizer: "eles gerem 35%, mas os resultados são muito bons!”, explica. Outra das razões prende-se com o facto do Fundo ser gerido por José Filomeno dos Santos, filho de José Eduardo dos Santos, e por isso "haver a pressão no sentido de apresentar resultados”.Carlos Rosado não duvida que "estes resultados não correspondem à realidade”. "São resultados potenciais, não são resultados efetivos”, reafirma. Para o analista, "os resultados (do Fundo) têm que estar acima de qualquer suspeita”. Lembrando que, em 2015, o FSDEA registava prejuízos de mais de 130 milhões de dólares, Jane Morley, diretora regional para África do centro de análise econômica britânico Economist Intelligence Unit (EIU), afirma que o facto de o Fundo ter dado lucro pela primeira vez é uma "boa notícia” e que, "num contexto de volatilidade nos mercados globais, ter mais dinheiro para investir na economia é um aspeto positivo”. No entanto, esta responsável também tem as suas reservas relativas às especificidades deste Fundo. "Há vários problemas com o Fundo Soberano de Angola. Este Fundo não é um fundo de estabilização como acontece em outros países, o que significa que o dinheiro não pode ser usado para compensar reservas internacionais", explica.
Jane Morley nota ainda que o dinheiro do Fundo nem sempre foi investido da melhor forma. Por exemplo, tem-se investido muito dinheiro na área do turismo que não é uma prioridade, quando existem no país problemas graves em outras áreas. Ainda assim, e apesar de admitir ser "difícil” prever já os resultados do próximo ano, Jane Morley tem boas perspetivas. "Há alguns sinais de que o novo Governo de João Lourenço possa trazer uma nova abordagem para o fundo, o que seria positivo", conclui.
Raquel Loureiro/cp
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