Tratado que criava a União Europeia e abria caminho para adoção do euro foi assinado há 25 anos na cidade holandesa. Desde então, critérios para uso da moeda única nem sempre foram respeitados pelos signatários. Sete de fevereiro de 1992 foi a data da assinatura do Tratado de Maastricht: a antiga Comunidade Europeia dava lugar à União Europeia (UE) e era lançada a pedra fundamental para uma política externa e de segurança comuns. O acordo abria ainda caminho para a introdução de uma moeda comum, o euro, e o consequente fim das moedas nacionais. Ele era o passo mais ambicioso já dado para a integração da Europa.
Dois dos mais importantes pontos do tratado, os chamados "critérios de convergência", estão relacionados à disciplina orçamentária e, com isso, à estabilidade da moeda europeia: o deficit orçamentário de um país integrante da união monetária não pode exceder 3% do Produto Interno Bruto (PIB), e a sua dívida pública não pode superar 60% do PIB. Sobretudo a Alemanha insistiu nesses pontos, embora a ideia dos 3% tenha sua origem num jovem francês.
Guy Abeille era um funcionário de baixo escalão no Ministério francês das Finanças quando, em 1982, recebeu a missão de formular uma regra para limitar os deficits públicos que fosse ao mesmo tempo simples e soasse como competência econômica. Naquela época, o deficit público francês estava ameaçado de sair de controle após a experiência socialista do presidente eleito no ano anterior, François Mitterrand.
O deficit público francês de então correspondia a 2,6% do PIB. Abeille pensou: um teto de 1% seria irrealista; 2% também colocaria o governo sob pressão. Então, optou pelos 3%. Foi assim, de forma simples e arbitrária, que nasceu a fórmula mágica que mais tarde foi incluída nas negociações sobre o Tratado de Maastricht como um dos mais importantes critérios para a adesão à união monetária.
Três quintos são 60%
"A marca de 60% para a dívida pública também é de natureza arbitrária", diz Oliver Sievering, da Escola Superior de Administração Pública e Finanças de Ludwigsburg. Afinal, no início dos anos 1990, a dívida pública de muitos países era justamente de cerca de 60% do PIB. Os dois percentuais acabaram virando piada entre os economistas: "Se a economia cresce nominalmente 5%, então a dívida pública pode aumentar 3%. Três quintos são 60%", relembra Sievering.
Mas logo ficou claro que um crescimento anual de 5% era utópico. O mesmo vale para a meta de 60% no caso de muitos países, como Bélgica, Itália e Grécia. Então, a opção foi se concentrar no critério dos 3%, dentro da lógica de que, com ele, pelo menos o endividamento estava evoluindo numa direção positiva. À exceção da Grécia, todos os candidatos a adotar o euro citados no relatório de convergência do Instituto Monetário Europeu de 1998 apresentavam um deficit público inferior a 3% do PIB.
Alguns deles lançaram mão de truques para se manter dentro dos 3%, incluindo a Alemanha. O governo alemão vendeu ações da empresa de telecomunicações Deutsche Telekom e da empresa de correio Deutsche Post ao banco estatal KfW para reduzir, assim, sua dívida. A Itália até criou um imposto europeu, restituindo-o, em grande parte, aos contribuintes logo após a adoção do euro.
Mau exemplo de Alemanha e França
Os dois critérios de Maastricht não valem só na hora de adotar o euro – eles devem também ser cumpridos após a entrada no clube, para que a moeda comum mantenha uma base sólida. Essa exigência veio principalmente da Alemanha. Só que foi justamente a Alemanha que, junto com a França, ultrapassou o limite de 60% do deficit em 2002 – e os dois pesos pesados do euro acabaram apelando para um jeitinho: flexibilizaram as regras e conseguiram, assim, evitar bilhões de euros de multa. "Isso prejudicou muito a disciplina orçamentária em toda a área do euro porque os outros países disseram: 'Se a Alemanha e a França não respeitam os critérios, por que nós temos que respeitar'", comenta Sievering.
No auge da crise financeira, quase todos os países estavam fora da meta. Hoje, a maioria dos membros do euro tem o deficit público novamente sob controle, só que, no tocante à dívida pública, somente os três Estados bálticos, a República Tcheca, a Eslováquia e Luxemburgo estavam abaixo do limite de 60% em 2015. A Alemanha novamente não ampliou seu endividamento em 2016, mas sua dívida pública ainda é de 70%, bem acima do limite permitido.
Embora os critérios de Maastricht tenham sido violados mais de 200 vezes, nunca foi imposta uma penalidade. "Ninguém quer condenar o outro a uma multa porque sabe que, em alguns anos, ele mesmo pode estar nessa situação e aí vai ficar contente se também for tratado com clemência", observa Sievering. Em outras palavras: os infratores de hoje são julgados pelos potenciais infratores de amanhã.
Mesmo que, na prática, o mecanismo de punição não funcione, o economista considera essas duas regras indispensáveis. Segundo ele, o simples fato de haver um monitoramento e de que se fale sobre isso já surte um efeito disciplinar.
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