A decisão de se candidatar à reeleição como chefe de governo oferece muitas oportunidades. Merkel poderá ser a resposta certa ao populismo que se alastra pela Europa e o mundo, opina o jornalista Kay-Alexander Scholz.Angela Merkel já é chanceler federal da Alemanha há 11 anos e presidente da União Democrata Cristã (CDU) há quase 16 (!). Nesse período, ela colocou muita coisa em movimento: guinada no endividamento, redução das taxas de desemprego à metade, duplicação dos investimentos em pesquisa e modernização de seu partido.
Na política externa, a Alemanha passou a ser mais escutada – até porque os demais países baixaram a voz demais. Desse modo, a Chancelaria Federal alemã ditou o tom nas crises financeira, do euro e da Crimeia.
Para não poucos, Merkel movimentou até demais. Os velhos conservadores da CDU maldizem a "social-democratização" do partido. Para um de cada dois alemães, os 1 milhão de migrantes que ela deixou entrar no país foram demasiados.
Os populistas de direita da legenda Alternativa para a Alemanha (AfD) se beneficiam disso e do atual zeitgeist, o clima dominante de crítica generalizada às elites, e vão estendendo sua rede numa nova "Internacional da ultradireita". Outros criticam Merkel por não ter feito o suficiente para amortecer os riscos de longo prazo de sua política.
Por mais que no momento cheguem de fora tantos elogios, em parte exagerados – com os quais, aliás, ela lida com a usual cautela –, na Alemanha as opiniões a respeito da premiê são divergentes. Uma saída sua da política, agora, não seria especialmente honrosa.
Como diz o velho ditado: "Quem faz a fama, deita na cama". Não se trata, aqui, da tão alemã Schadenfreude, a alegria pelo dano alheio, mas sim da chance de uma satisfação. A candidatura à reeleição abre para Angela Merkel a possibilidade de, por mais quatro anos, ter a chance de seguir configurando ou de corrigir tudo aquilo que iniciou, sobretudo as consequências da crise dos refugiados. O fato de ela aceitar esse desafio lhe renderá pontos de simpatia.
A líder conservadora pode ter a chance de mostrar que, após todos estes anos no palco da política europeia e mundial, ela não esqueceu as necessidades dos alemães. Ela poderá mostrar que há boas respostas para o novo conflito entre ricos e pobres, entre a cidade e o campo. Isso lhe permitiria pelo menos deter ou, melhor ainda, amenizar a divisão social e a polarização política, o solo fértil sobre o qual o populismo de direita prospera.
A antiga e talvez nova chanceler federal teria a chance para tal, por dispor da necessária concentração de poder, reputação e experiência. Por ter a liberdade – sendo pragmática como é – de procurar soluções livres de ideologia para os problemas. E por estar agora disposta a enfrentar deliberadamente esses problemas.
Para Merkel, a coesão da sociedade é a receita contra a polarização – como disse ao anunciar sua candidatura na noite deste domingo (20/11). Ela quer assumir a luta. Muito bem!
Se colocar isso em prática, ela poderá preservar sua CDU de seguir sendo devorada pela AfD. E mais ainda: poderá mostrar ao Ocidente que há alternativas diferentes das que o atual zeitgeist populista sugere.
E mais uma coisa: as chances de Merkel também estão em utilizar seu papel de modelo como mulher no alto da hierarquia do Estado, para os muitos milhares de mulheres que vivem agora na Alemanha, recém-chegadas de uma cultura que lhes concede direitos insuficientes.
Para estas, Merkel poderá ser um incentivo à emancipação. Como afirma a ciência, as mulheres são decisivas no processo de integração numa nova sociedade. A premiê democrata-cristã poderá lhes transmitir impulsos que então irradiarão positivamente para dentro da sociedade como um todo.
Nesse sentido, a decisão de Merkel de continuar como chefe de governo é plena de oportunidades e, portanto, uma boa decisão!
Kay-Alexander Scholz é jornalista da DW
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