"Ex-conselheiro do Carf nega tráfico de influência no órgão"

Outro depoente desta terça-feira (28) afirmou que ex-ministra da Casa Civil frequentava escritório de lobista acusado de intermediar venda de sentenças
William Sant·Ana 
Audiência pública para tomada de depoimentos. Ex-Conselheiro do Carf, Leonardo Siade Manzan
Ex-conselheiro do Carf Leonardo Manzan (D) afirmou que é inocente em relação às acusações de compra de sentenças no órgão
Em depoimento à CPI do Carf nesta terça-feira (28), o advogado Leonardo Manzan, ex-conselheiro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) se disse inocente da acusação de envolvimento em compra de sentenças, mas não convenceu os deputados ao explicar como foi indicado para o conselho e ao negar incompatibilidade entre sua atuação e os interesses do pai, que defendia empresas devedoras.
A CPI também ouviu o depoimento de Hugo Rodrigues Borges, ex- funcionário de empresas do ex-conselheiro do Carf José Ricardo da Silva, também denunciado por venda de sentenças.

O Carf é o órgão do Ministério da Fazenda que julga recursos de empresas autuadas pela Receita. Segundo a Operação Zelotes, da Polícia Federal, a venda de sentenças no Carf causou um prejuízo de R$ 19 bilhões aos cofres públicos. “Não existe uma prova sequer desse prejuízo”, disse Manzan.
Leonardo Manzan é genro do ex-secretário da Receita Federal e ex-presidente do Carf Otacílio Dantas Cartaxo. Além disso, é filho do ex-auditor fiscal Agenor Manzano, dono da empresa de lobby SBS, que teve como sócio Eivany Antônio da Silva, por sua vez pai de outro ex-conselheiro do Carf, o advogado José Ricardo da Silva – sócio de outra empresa de lobby, a SGR.
O grupo é acusado de ter operado em benefício da empresa Qualy Marcas Comércio e Exportação de Cereais que, depois de recorrer ao tribunal administrativo, recebeu R$ 37,6 milhões dos cofres públicos como expurgos inflacionários que teriam sido acumulados na década de 1990, quando o país passou por planos econômicos e mudanças de moeda.
Segundo a Polícia Federal, durante os onze anos em que o Processo Administrativo Fiscal tramitou no Carf, o empresário Ramiro Júlio Ferreira Júnior pagou R$ 4,3 milhões ao grupo de intermediários: as empresas SBS e SGR. A Operação Zelotes, da Polícia Federal, encontrou R$ 1,5 milhão em espécie na casa de Manzan.
“Não era R$ 1,5 milhão, mas esse dinheiro já está devidamente declarado na Receita Federal, com origem comprovada e tudo isso está na Justiça, o que comprova minha inocência”, disse, ao responder pergunta do relator da CPI, deputado João Carlos Bacelar (PR-BA).
Indicação
Manzan negou ter havido qualquer influência de Cartaxo ou indicação política para que ele assumisse o cargo de conselheiro do Carf, que não era remunerado. “Eu apresentei meu currículo para a CNC [Confederação Nacional do Comércio] e eles me indicaram”, disse, ao responder pergunta do deputado Joaquim Passarinho (PSD-PA).

“Então senhor foi indicado conselheiro do Carf, órgão onde seu pai atuava na defesa de empresas, sem ganhar nada, e acha que não há nenhuma incompatibilidade?”, perguntou o deputado.
“O senhor queria que meu pai fechasse o escritório? O Carf é a melhor escola de direito tributário do país, este era o meu interesse”, alegou o depoente.
O advogado disse desconhecer que a Qualy era defendida pela empresa do pai dele. “Eu tinha meus clientes e meu pai os dele. Eu apenas ocupava uma sala na empresa dele”, alegou.
Manzan também foi confrontado pelo relator da CPI, deputado João Carlos Bacelar (PR-BA), a respeito de suas relações profissionais e familiares com Cartaxo.
“Qual sua relação com Otacílio Cartaxo, ex-secretário da Receita e ex-presidente do Carf?”, perguntou Bacelar. “Relação de genro e sogro”, respondeu.
“Sua sogra, Fátima, me procurou e disse que o senhor “vendia” a proximidade com Cartaxo no país todo. É verdade?”, insistiu Bacelar. “Duvido que ela tenha dito isso”, disse Manzan. “O senhor está disposto a fazer uma acareação com ela e com Cartaxo?”, perguntou o relator. “Se for a respeito de informações institucionais e não sobre o aspecto jurídico-pena, sim”, respondeu o advogado.
O segundo depoente do dia na CPI, Hugo Rodrigues Borges, foi funcionário de empresas do ex-conselheiro José Ricardo. Em depoimento à CPI, ele disse que fazia saques de grandes quantias em dinheiro a mando de José Ricardo. “Às vezes pegava R$ 500 mil, R$ 800 mil, mas eu não sabia a origem nem para que era. O estranho é que o escritório vivia sem dinheiro para pagar contas, apesar de todos esses saques”, disse.
Ele confirmou que a advogada e ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra, assim como o ex-ministro de Minas e Energia Silas Rondeau, frequentavam o escritório, localizado na QL 14 do Lago Sul.
Requerimentos
Também estava na pauta da CPI a votação de 89 requerimentos, entre os quais os que pedem a convocação de 55 pessoas, entre empresários, acusados de corrupção no Carf e agentes políticos. Os requerimentos não foram votados por falta de quórum.

Entre os pedidos de convocação estão os dos empresários André Gerdau, presidente da metalúrgica Gerdau; Jorge Gerdau; Wesley Batista, diretor-presidente do Grupo JBS; Joesley Batista, presidente do conselho de administração do Grupo JBS; Eduardo Sirotsky, diretor do Grupo RBS; Luís Carlos Trabucco, presidente do Bradesco; Roberto Setúbal, presidente do Itaú/Unibanco; Sérgio Rial, presidente do Santander; Rossano Maranhão, principal executivo do Banco Safra; Adriano Cabral Volpini, principal executivo do Bank Boston; Persio Arida, presidente do banco BTG Pactual; Stevem Armstrong, presidente da Ford do Brasil; e João Alves de Queiroz Filho, fundador do grupo Hypermarcas.
Também há pedidos de convocação de pessoas relacionadas a agentes políticos, como Luís Cláudio Lula da Silva e Fábio Luiz Lula da Silva, filhos do ex-presidente Lula; do ex-secretário geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho; do ex-ministro de Minas e Energia do governo Lula, Silas Rondeau; e do ex-senador Delcídio do Amaral.
Dada a quantidade de requerimentos, o presidente da CPI, deputado Pedro Fernandes (PTB-MA), pediu ao presidente em exercício da Câmara, Waldir Maranhão, mais 60 dias de prazo de funcionamento da comissão. Semana passada, Maranhão concordou em prorrogar a CPI, que terminaria em 2 de julho, por mais 15 dias, mas apenas para a apresentação e votação do relatório final.
Reportagem - Antonio Vital
Edição - Mônica Thaty

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