O não reconhecimento, pelo governo brasileiro, da República Árabe Saharauí Democrática dividiu opiniões nesta quinta-feira (30) em audiência pública na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados. A região do Sahara Ocidental, na África, é disputada pelo povo Saharauí, que habita a região, e pelo Marrocos há cerca de 40 anos.
A chefe da Divisão de Paz e Segurança Internacional do Itamaraty, ministra Maria Luisa Escorel de Moraes, disse que o Brasil não reconhece a República Árabe Saharauí Democrática por entender que a solução sobre o status do território deve ser pacífica, alcançada pelo entendimento mútuo entre as partes. “Somente assim será possível uma solução duradoura para o conflito”, afirmou.
Essa posição foi apoiada por alguns integrantes da comissão, como o deputado Wadson Ribeiro (PCdoB-MG), que pediu a audiência pública. Ele acredita que a posição da política externa brasileira tem sido equilibrada. A presidente da comissão, deputada Jô Moraes (PCdoB-MG), também defende que o Brasil continue adotando a posição de “não interferência nos conflitos do mundo”.
Colonialismo
Já a presidente do Conselho Mundial da Paz, Socorro Gomes Coelho, defendeu que o Brasil reconheça a República Saharauí, por entender que a permanência do colonialismo na região é “criminosa”. “No Sahara Ocidental, não acontece um conflito entre países, mas um conflito entre um povo e um ocupante”, salientou.
Para ela, é preciso que as duas partes busquem o diálogo, mas, se uma parte é extremamente poderosa, utiliza-se de armas, e a outra é vitimada, tem direitos humanos e meios de sobrevivência tolhidos, é preciso que outras nações interfiram. “Resolver o conflito é garantir a soberania e autodeterminação do povo Saharauí”, completou.
Autodeterminação
A Assembleia Geral das Nações Unidas reconhece, desde 1960, o direito do povo Saharauí à autodeterminação e independência. A região foi colônia espanhola a partir de 1884, mas a ONU recomendou à Espanha a desocupação do território ainda nas décadas de 1960 e 1970.
Porém, contrariando essa orientação, a Espanha cedeu, em 1975, a Região Saharauí ao Marrocos, que a invadiu e a ocupou militarmente. Resoluções das Nações Unidas repudiaram essa situação, mas a maior parte do território permanece ocupada pelo Marrocos.
Socorro Gomes Coelho destacou que hoje um muro cerca o Sahara Ocidental – o segundo maior muro do mundo, depois da Muralha da China –, vigiado por soldados, que vem impedindo o povo Saharauí de acessar seus recursos naturais e tem dificultado a convivência da população. Ela salientou que na América Latina só faltam cinco países reconhecerem a República Saharauí, incluindo o Brasil.
"Não é paz, é medo"
O deputado Jean Wyllys (Psol-RJ), que também pediu a audiência, considera “curioso” que ainda se discuta a autodeterminação dos povos em pleno século XXI. “Paz sem voz, não é paz, é medo”, disse, repetindo um refrão de música popular. "O povo tem que dizer o que quer para si mesmo”, afirmou, defendendo o referendo no Sahara Ocidental, em que o povo decidirá pela independência em relação ao Marrocos ou se quer ser parte do país.
Conforme o representante da Frente Polisário no Brasil (representando o povo Saharauí), Mohamed Laarosi Bahia, 23 anos depois da decisão das Nações Unidas pela realização do referendo, o Marrocos continua se negando a realizá-lo e a promover uma solução democrática para o conflito. “Isso vem causando grande frustração das novas gerações”, disse. Ele destaca que a comunidade internacional não dá a devida importância à questão.
Reportagem – Lara Haje
Edição – Newton Araújo
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