"Ministro defende reformulação da parceria via Lei Rouanet para evitar assimetrias regionais"

Na opinião do ministro da Cultura, Juca Ferreira, o atual modelo de parceira público-privada via Lei Rouanet (8.313/91) precisa ser reformulado a fim de evitar o aprofundamento de assimetrias regionais. Segundo ele, 80% do orçamento do governo para financiar as políticas culturais vêm das deduções fiscais da lei, no entanto o investimento em projetos culturais concentra-se no do eixo Centro-Sul. O ministro acredita que grande parte dos projetos financiados são os que dão “retorno de imagem” para as empresas.
Durante audiência pública promovida nesta quarta-feira (20) pela Comissão de Cultura da Câmara, o ministro assinalou que é preciso criar critérios para que se possa distribuir recursos pelo Brasil inteiro, “para todas as áreas da cultura e para as culturas de todas as classes sociais", sustentou Ferreira.
Ele acredita que a reforma deve abranger também a forma de pensar a cultura: “não é a cereja do bolo, e sim uma parte essencial da economia”. O titular do Minc informou que, a despeito dos problemas, o setor representa 6% do Produto Interno Bruto (PIB).
Renovação de mecanismos de financiamento
O deputado Giuseppe Vecci (PSDB-GO) quis saber qual estratégia o ministério vai adotar para renovar seus mecanismos de financiamento via Tesouro, Fundo Nacional de Cultura (FNC) e lei do audiovisual (Lei 8.685/93).

Ele alertou para o fim da validade, em 2016, do Vale Cultura, que permite acesso a bens culturais aos trabalhadores que recebem até cinco salários mínimos. O parlamentar considerou exíguos os recursos destinados ao Vale Cultura neste ano (R$ 3 milhões), bem abaixo do patamar de 2014 (R$ 1.3 bilhão).
O ministro Juca Ferreira se comprometeu a articular soluções junto ao Congresso Nacional para que a pasta receba mais recursos por meio de emendas parlamentares, que em 2015 alcançam o montante de R$ 20 bilhões. “O ministério está “negativado” com o Congresso, nós vamos apresentar muito em breve uma proposta para trazer maior eficiência na execução das emendas parlamentares”, assegurou.
Análise de projetos
Sobre a distribuição dos incentivos fiscais, Juca Ferreira disse que cabe ao Minc apenas atestar a relevância cultural do projeto, a seleção é feita pelo departamento de marketing da empresa. Ainda assim, cerca de 300 profissionais do Minc, a maior parte do copo funcional, trabalha com a análise dos projetos da lei Rouanet. “Além de ser um escândalo, a Lei cria um sistema de valores, no qual o relevante (promoção cultural) é irrelevante”, emendou.

Audiovisual
Já para a deputada Clarissa Garotinho (PR-RJ), a concentração de recursos no Rio de Janeiro e em São Paulo não atinge apenas a cultura, e sim a infraestrutura do País de forma geral. A parlamentar acredita que é preciso rever a política do audiovisual para aumentar o número de cinemas no Norte e Nordeste.

Clarissa Garotinho cobrou do Minc projetos que ampliem o parque exibidor do audiovisual, e lembrou que apenas 15% das cidades brasileiras abrigam salas de cinemas. Outra preocupação, do deputado João Marcelo Souza (PMDB-MA), é com a qualidade dos filmes nacionais, se comparados ao cinema argentino.
Em resposta, Juca Ferreira admitiu o excessivo espaço dos filmes norte-americanos que ocupam 75% do circuito de cinemas, no entanto disse que o setor avançou desde o fim da Embrafilme, em 1990. Ele informou que, na década passada, eram produzidos cerca de 6 filmes nacionais por ano, hoje são 600 obras.
Estímulo à cultura regional 
Juca Ferreira disse que uma das soluções para estimular a cultura regional é transformá-la em ativo, pagando royalties às comunidades e aproximando-as das universidades. “Enquanto a gente rejeita (o conhecimento tradicional), as grandes empresas de cosméticos mandam antropólogos para conversar com caboclos. Ao final, levam matrizes, fazem testes em laboratórios e patenteiam o produto”.

O ministro informou que mais de 1000 produtos elaborados com conhecimentos tradicionais brasileiros já estão patenteados por empresas estrangeiras.
Nesse ponto, o ministro acredita que a nova Lei da Biodiversidade sancionada nesta quarta-feira (20), pela presidente Dilma Rousseff, é um passo importante para o combate à biopirataria. A lei origina-se do projeto (PL 7735/14), aprovado pela Câmara, no fim de abril, para facilitar a pesquisa de plantas e animais nativos, com o objetivo de incentivar a produção de novos remédios, cosméticos e insumos agrícolas.
Recursos do programa
De acordo com dados do ministério, só em 2014, mais de 3 mil projetos captaram recursos por meio do Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), sendo 2.810 apresentados por pessoas jurídicas e 463, por pessoas físicas. Esses projetos levantaram um montante de R$ 1.32 bilhões referentes a doações e patrocínios feitos por incentivadores que se beneficiaram de renúncia fiscal prevista na Lei Rouanet.

A maior crítica ao sistema é o seu caráter excludente, segundo Juca Ferreira. O Amapá, por exemplo, não recebe nenhum incentivo por meio da Lei Rouanet.
Pelas regras atuais, os limites de deduções da Lei Rouanet são definidos pelo Executivo por meio de regulamento (Decreto 5.761/06) nos seguintes patamares: 6% do imposto devido para pessoas físicas e 4% para pessoas jurídicas.
Em março de 2014 a Câmara aprovou texto, que aumenta os limites de dedução do Imposto de Renda para as doações feitas a projetos culturais e cria o Programa Nacional de Fomento e Incentivo à Cultura (Procultura). Para pessoas físicas e jurídicas, o limite dedutível poderá chegar a 8% do imposto devido. Atualmente a medida é analisada pelo Senado.
Reportagem – Emanuelle Brasil
Edição – Regina Céli Assumpção

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