Partidos nanicos de extrema direita poderão ser fundamentais para definir formação do novo governo. Likud, de Netanyahu, lidera pesquisas ao lado de legenda de centro. Mas, quem ganhar, não governará sozinho.É uma noite tranquila na badalada área portuária de Tel Aviv. Uma multidão, composta na maioria por jovens religiosos, se reúne para um evento de campanha de Moshe Feiglin, o líder do partido ultranacionalista Identidade ("Zehut" em hebraico). Em um canto na parte frontal do centro de eventos, alguns fumam maconha sentados em um gramado artificial. Ao lado, um grupo de homens reza. Na parte interna, onde o livro de Feiglin está em exposição, uma multidão é recebida com pipocas.
"Chegou a hora de libertar o sistema político da paralisia dos últimos 70 anos", diz Feiglin, recebendo aplausos entusiasmados. "Não importa se você é de direita ou de esquerda. Ambos querem um Estado que intervenha, um 'Estado profundo' que dividirá nosso país em dois Estados." Ele diz que seu partido quer apenas "um Estado": o Estado de Israel, incluindo os territórios palestinos ocupados.
O recém-fundado Identidade é um dos muitos partidos ultranacionalistas de pequeno porte que concorrem às eleições desta terça-feira (09/04). Até 2015, Feiglin era membro do partido governista Likud – do premiê Benjamin Netanyahu – no Knesset, o Parlamento israelense.
O Identidade vem ganhando destaque principalmente por defender a legalização da maconha, o que levou alguns jornalistas israelenses a descrevê-lo como o partido dos "novos truques". Para a surpresa de muitos, a legenda vem subindo nas pesquisas nos últimos meses. Segundo as projeções, o grupo poderá conquistar entre quatro e seis cadeiras no Knesset."O Identidade é uma criatura estranha", avalia Gideon Rahat, membro sênior do Instituto para a Democracia de Israel e professor da Universidade Hebraica. "Ele inclui muitas ideias de extrema direita sobre o Monte do Templo e a Grande Israel junto com a legalização da maconha. Parece ser uma tentativa de sucesso ao oferecer algo diferente."
Essa mistura também atrai eleitores de fora do tradicional bloco ultranacionalista. "Sou usuário de canábis e ensino aos outros o quanto pode ser benéfica, é por isso que a legalização é o mais importante, porque é como uma cura para essa nação", afirma Ben Cherut, um jovem apoiador do Identidade.
As políticas do partido foram detalhadas em um documento de 300 páginas, que pede reformas de amplo alcance nos sistemas de educação e saúde e propõe casamentos civis sem a interferência dos rabinos.
"Feiglin é um fenômeno interessante, mas não é o único", afirma Tamir Sheafer, professor de comunicação política e reitor da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Hebraica. "Acho que em quase todas as direções temos partidos novos que englobam muitas pessoas que querem dar um voto de protesto."
Sara Joy é um exemplo de alguém que não se sente como uma eleitora de protesto. Ela diz que o Identidade oferece uma alternativa nova, especialmente em questões sociais e econômicas. "É apenas um sinal de que as coisas precisam mudar. Quase todos os outros partidos de direita no Knesset atualmente não possuem estratégia sobre coisa alguma, e o Identidade possui um livro inteiro de políticas articuladas", diz a eleitora de 30 anos.O partido também defende a soberania judaica sobre o Monte do Templo e o complexo em torno da mesquita Al-Aqsa, locais considerados sagrados por judeus e muçulmanos. O Identidade propõe ainda abolir o acordo de paz de Oslo com os palestinos e anexar a Cisjordânia ocupada. Defende, ainda, que os residentes árabes de Israel devem ser "integrados" ou receber incentivos para deixarem o país.
Na visão de Joy, isso é um "pensamento realista". "Queremos a paz, mas precisamos nos levantar e dizer que esta é a nossa terra", afirmou a jovem. "Tentamos a solução de dois Estados por 25 anos e não está funcionando. A situação atual é insustentável."
O Identidade poderá ter o papel fundamental de decidir quem estará no poder após as próximas eleições. Até agora, Feiglin se recusou a dizer se aceitaria uma coalizão com o Likud ou com o centrista Kahol Lavan, liderado pelo ex-chefe do Exército Benny Gantz.
O Likud e o Kahol Lavan estão à frente nas pesquisas, disputando a liderança cabeça a cabeça. Por causa do sistema multipartidário em Israel, Netanyahu necessita de outros partidos para formar uma coalizão de governo. Para a maioria dos analistas, as eleições vão decidir se o país terá um governo centrista, ou mais à direita e religioso e ainda encabeçado pelo atual premiê.
"O mais simples que se pode dizer da política de Israel como país é que temos mais direitistas do que esquerdistas", disse Sheafer. "Não era assim há 20 anos, quando Israel era bem mais para a esquerda."
O partido nacionalista religioso Lar Judaico chegou a integrar a coalizão governista. Mas, duas de suas principais figuras, o ministro da Educação, Naftali Bennett, e a ministra da Justiça, Ayelet Shaked, abandonaram a legenda para fundar o movimento "Nova Direita".Shaked, que costuma criticar o sistema de Justiça do país, ganhou destaque recentemente com um comercial de campanha controverso que mostrava um perfume chamado "Facismo".
Atualmente, um grupo maior do que o habitual de partidos nanicos está de olho no Knesset. Para manter abertas as suas opções, Netanyahu chegou ao ponto de fazer com que três pequenos partidos ultradireitistas se juntassem à sua aliança eleitoral, sem a qual eles dificilmente conseguiriam ultrapassar o mínimo de 3,25% dos votos para conquistar cadeiras no Parlamento.
Entre essas legendas está o Poder Judaico ("Otzma Yehudit"), um grupo que segue os ensinamentos extremistas do rabino Meir Kahane, assassinado nos EUA nos anos 1990. Seu antigo partido, o Kach, era conhecido pela violência e racismo contra os árabes e por propagar a ideia de uma "Grande Israel" e a transferência da população árabe.
Apesar de os EUA considerarem o Kach como uma organização terrorista, e de ter sido banido em Israel, sua ideologia sobrevive às margens da política israelense. Em março, a Suprema Corte de Israel proibiu o líder do Poder Judaico Michael Ben-Ari de concorrer às eleições por causa de atitudes racistas.
Em meio a enormes críticas em todo o país, analistas apontam que ainda é cedo para saber se algum candidato remanescente do Kach conseguirá entrar no Knesset. A atitude de Netanyahu de promover uma aliança com essas legendas foi amplamente criticada em Israel e no exterior, considerada como um "ponto moral baixo", uma vez que poderá trazer de volta ao Knesset as ideias extremistas do Kach.
Tania Krämer/Caminho Político
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