O presidente da Fundação Maurício Grabois analisou o papel do julgamento do ex-presidente Lula no contexto do golpe de Estado brasileiro durante evento de solidariedade internacional ao presidente Lula, que reuniu 80 organizações europeias e latino-americanas em Porto Alegre, no dia 22 de janeiro. De acordo com Renato Rabelo, o golpe levou à quebra da institucionalidade, provocando o desvio de função dos poderes da República, com a exorbitância do poder judiciário e para-judiciário na ordem política do país. Para sustentar o caminho golpista, analisa o presidente da Fundação Maurício Grabois, a cúpula dominante estatal quer condenar Lula e inviabilizá-lo politicamente, o que conformaria o Estado de exceção encoberto como Estado de Direito. A síntese da avaliação de Renato Rabelo é que a defesa da participação de Lula nas eleições presidenciais de 2018 concentra a luta pela democracia, pela prevalência do Estado Democrático de Direito.
O evento aconteceu às vésperas do julgamento histórico para a democracia, que mobilizou amplos setores da sociedade em todo o país, com forte presença em Porto Alegre, onde ocorrerá o julgamento nesta quarta-feira (24), e atos em todo o país. A Fundação Maurício Grabois tem se empenhado na tarefa de desvendar a essência do golpe, como destaca Renato Rabelo no artigo a seguir.
Leia a íntegra do texto:
O PCdoB e sua Fundação Maurício Grabois -- nos associamos ao PT e sua Fundação Perseu Abramo -- para agradecer a presença de vocês, dirigentes partidários lideranças políticas de vários países, que se deslocaram até o Brasil, em Porto Alegre, em um momento decisivo para o destino e o futuro do Brasil, na luta pela causa democrática, pela soberania e pelo progresso social em nosso país. Valorizamos especialmente a vossa solidariedade por estarem aqui conosco nesse momento excepcional.
Hoje, o Brasil vive uma crise profunda, grave e singular. Esta crise reflete um conjunto de impasses estruturais brasileiros, num contexto mundial de crise sistêmica do capitalismo contemporâneo, instabilidades, guerras neocoloniais e transição na geopolítica de poder internacional.
Em nosso país o impeachment da presidenta Dilma Rousseff em 31 de agosto de 2016 foi um golpe de Estado de novo tipo contra a democracia, perpetrado pelo Parlamento, endossado pelo Judiciário e capitaneado por um poderoso conjunto de forças políticas, judiciais, midiáticas e empresariais - UM GRANDE PACTO DOS SEGMENTOS MAJORITÁRIOS DA CLASSE DOMINANTE, de costas ao povo e contra o povo. A mídia monopolizada teve papel de destaque na mobilização de uma base social - sobretudo de camadas médias altas - reacionárias e intolerantes.
A trama golpista foi longamente preparada e teve apoio externo, como parte da ofensiva imperialista na região – hoje em curso para liquidar as conquistas políticas aqui alcançadas – por conseguinte conter o papel progressista do Brasil na América do Sul. Tal ofensiva do imperialismo e da reação interna vem instrumentalizando o combate à corrupção – com auxílio da mídia e de setores do aparato estatal – com o objetivo de desestabilizar governos progressistas.
Na decorrência do golpe no Brasil cada dia fica mais nítido a conexão direta entre a Operação Lava Jato e o Departamento deJustiça dos EUA. Essa Operação judicial-policial, junto com o maior monopólio de comunicação do país, a Rede Globo, foram os instrumentos decisivos das forças dominantes internas e externas para alavancar o golpe de Estado em nosso país.
Tal Operação junto com a mídia dominante do país assumiu um caráter partidário e suspeito, usando o expediente do que se denomina de lawfare em proveito de um grande ativismo judicial, ou um tipo de regime, já caracterizado, como ditadura da toga, tendo como mote o combate à corrupção. Derrogam a Constituição de 1988, pós-golpe militar, reinterpretam leis, avantajando as normas de exceção dentro no Estado de direito.
Mas essa narrativa da corrupção começa a ruir diante de toda sociedade, por quanto o governo ilegítimo de Michel Temer é entronizado na presidência por eles, na destituição da presidenta Dilma Rousseff, por meio de um impeachment fraudado. Este governo imposto é formado por uma verdadeira organização política criminosa, mão de obra do golpe, deixando um rastro de escândalos (malas e sacos de dinheiro) que se sucedem à luz do dia.
Esse golpe parlamentar estabelece uma ordem dominante de grande retrocesso à democracia do país, à soberania nacional e ao progresso social. Agem velozmente se aproveitando do assalto ao centro do poder, entregando o país e se realinhando à geopolítica dos EUA, e se aproveitam até para excluir a vasta maioria do povo do Orçamento da República.
Pela própria natureza do golpe de Estado, o regime resultante está diante de um grande dilema. Como garantir essa ordem imposta, antipopular e vende pátria, tendo de haver eleições para presidência da República neste ano, conforme assegura a Constituição, que aliás, vem sendo vilipendiada por eles? Por isso submeter os rumos do país ao crivo da soberania popular --para esses setores da classe dominante, que alcançaram o poder pleno por um atalho golpista -- pode ser o seu fim. Tendo de haver eleições, seria imprescindível definitivamente impedir o retorno, pelo voto, daqueles que foram apeados do poder.
Diante disso tudo o ex-presidente Lula se eleva como um gigante na tormenta – agrava o dilema dos donos do poder. Todas as pesquisas de opinião colocam Lula bem à frente dos eventuais candidatos do regime dominante e afins, já acontecendo também essa dianteira nas projeções de segundo torno eleitoral. Nas hostes do conservadorismo, da direita e da extrema-direita, que aparece de corpo inteiro, das corporações do Estado onde prevalece a ideologia neoliberal e vende pátria, o anti-lulismo já alcançou agudo grau de radicalização.
Para esse pacto político, espúrio, dominante, a saída é empreender todos os meios que inviabilize politicamente Lula – é disso que cuidará o julgamento antecipado no próximo dia 24, com olho no calendário eleitoral. Resta ainda para eles a ressurreição de um candidato que vença as eleições de outubro. Ou em última instância o desplante de mudar matreiramente o sistema politico presidencial, por um casuísmo parlamentarista.
Para o Juiz Sergio Moro que se transformou em acusador e julgador de Lula, a condenação deste, é o ápice da sua operação persecutória, o fecho do golpe, com a já gasta roupagem-espetáculo alcunhada como a “maior luta contra a corrupção na história da República”. O lawfare do ativismo judicial na condenação específica de Lula revela, como acentua o jurista Afrânio Jardim, uma“bagunça” (desordem) no Direito Penal e no Direito Processual Penal, já atingindo até o Direito Civil. Por exemplo, na sentença condenatória do juiz Sergio Moro contra Lula, está lá mencionado “ato de oficio indeterminado” – segundo o jurista, “nunca tinha ouvido falar disso”.
Em suma o golpe de Estado levou à quebra da institucionalidade, provocando o desvio de função dos poderes da República, com a exorbitância do poder judiciário e para-judiciário na ordem política do país. O intuito da cúpula dominante estatal em condenar Lula e inviabilizá-lo políticamente, tem sido um passo decisivo para culminar o golpe e sustentar o seu caminho. Será a confirmação do estado de exceção encoberto como estado de direito. Em decorrência disso a luta pela participação de Lula no pleito à presidência da República em outubro próximo concentra destacadamente a luta pela democracia, pela prevalência do Estado democrático de direito. Hoje este é o propósito das forças de esquerda, democráticas, patrióticas e progressistas: não é uma questão de proteger Lula e a candidatura dele, salvar a esquerda, e sim salvaguardar a democracia. É a luta que incorpora progressivamente extensos contingentes da Nação, com a elevação da consciência de que, o que está em jogo, é o futuro do Brasil.
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